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Recentemente postei um texto sobre o que acho que toda pessoa que vem do mercado deveria saber antes de pensar em fazer um mestrado/doutorado.

Depois de mostrar que mestrado/doutorado não é exatamente o que muitos de nós esperamos que seja, ficou a questão…

Mas o que ganha então um profissional do mercado ao fazer um mestrado/doutorado?

Este texto é uma tentativa de resposta a essa pergunta. Aproveito também para dar exemplos que mostrem como funciona a dinâmica no meio da pesquisa acadêmica. Assim o profissional do mercado que tiver interesse em entrar nesse mundo já vai se familiarizando com a coisa toda. Lembro que o texto é baseado na minha experiência particular e que SEM DÚVIDA MINHA EXPERIÊNCIA NO MERCADO TAMBÉM TROUXE MUITOS GANHOS QUANDO DECIDI SEGUIR UMA CARREIRA ACADÊMICA. De maneira alguma os pontos que levanto são exaustivos. Além do mais, todas as aptidões e experiências que vou apresentar aqui poderiam ter sido desenvolvidas e vividas em vários outros ambientes que não a academia. Mas é difícil que você passe por um mestrado/doutorado e não desenvolva essas aptidões ou tenha essas experiências. AÍ VÃO ELAS…

AMPLIAR AS POSSIBILIDADES DE AÇÃO Nas decisões de carreira sempre procuro privilegiar caminhos que ampliem minhas possibilidades de ação. Vale o velho ditado de não colocar todos os ovos em uma única cesta. A partir do momento que você tem um mestrado/doutorado você amplia consideravelmente seu campo de ação.

Fonte desconhecida. Um acréscimo óbvio é a possibilidade de atuar como professor, seja em faculdades/universidades públicas ou privadas. Temos aí uma oportunidade de ter mais de uma fonte de renda. Houve um período em que trabalhei como engenheiro de software em um projeto que dava sinais de que iria terminar. Notando isso, decidi procurar outro emprego. Como já não era um iniciante, tinha que ser mais seletivo, mas ao mesmo tempo sabendo que a qualquer momento o projeto poderia encerrar e eu ficaria sem renda. Nesse época eu já tinha concluído meu mestrado e atuava também como professor em faculdade privada durante a noite. Isso (e uma reserva de emergência bem planejada) me deu tranquilidade para fazer essa transição sem aperreio. Se uma cesta caísse eu ainda tinha outra.

Outra possibilidade, menos óbvia, é a atuação como pesquisador, seja em instituições públicas ou privadas, no Brasil ou no exterior. Apesar de ainda serem raras as vagas para pesquisadores em empresas no Brasil, elas existem. É só saber procurar. Mas quando se olha para as possibilidades no exterior isso se amplia muito. Pra quem é da área de computação sabe que todas as grandes multinacionais tem demanda para doutores nos seus departamentos de P&D. Tenho alguns vários amigos que são contratados na Microsoft Research, Amazon, Facebook, etc. Eles atuam como pesquisadores empresariais. O requisito é ter doutorado! Então se você pensa em sair do Brasil e tem não só a possibilidade de aplicar para empregos no mercado de desenvolvimento de software (engenheiro, gerente, etc), mas também para vagas de pesquisador, isso facilita bastante as coisas.

Uma outra opção ainda menos óbvia é a diversificação em outras áreas de conhecimento. Em outras palavras, fazer pesquisa tendo a computação aplicada à outras áreas, como por exemplo, educação, biologia, medicina, matemática, física, etc. Conheço pessoas que atualmente são coringas. Conseguem extrapolar o mercado de software e atuar em várias outras áreas.

Um exemplo é o grande Jones Albuquerque, que antes de tudo é uma figura ímpar. Ele é a representação arquetípica de um cientista. Se não existisse ciência no mundo, ele ainda sim seria um cientista (palestra de Jones no TEDx). Ele tem toda sua formação em computação. Graduação, mestrado e doutorado. Mas tem uma base muito forte em matemática e há um bom tempo tem usado todo conhecimento dessas duas áreas pra resolver problemas da saúde e da biologia. Além de ser professor de computação, ele atualmente atua como pesquisador convidado em centros de saúde. Mas pra quem pensa que ele é um simples acadêmico, é bom saber que ele também é sócio e co-fundador de uma startup na área de saúde. Ele inclusive lidera uma das mais robustas iniciativas de análise epidemiológica do COVID-19 no Brasil, a IRRD.“THIS IS REAL SCIENCE!” como ele costuma falar. Alguém com essa atuação e formação ampla é bem vindo em qualquer empresa/universidade não só na área de computação, mas também de saúde e matemática.

APRENDER A LIDAR COM A REJEIÇÃO Acho que tirando as pessoas que trilham um caminho empreendedor, dificilmente têm-se um carreira tão cheia de rejeições jogadas constantemente na sua cara como na academia. Quando se é um aspirante a pesquisador (quem ainda está fazendo mestrado/doutorado) aí que essa realidade bate à porta com força.

Coisa mais comum é você trabalhar meses e até anos em uma pesquisa e quando tenta publicá-la você recebe um reject atrás do outro.

Fonte desconhecida. Fernando Castor, um pesquisador experiente e de alto nível na área de computação aqui no Brasil, relata sua saga de quase quatro anos e quatro rejeições em conferências e revistas científicas para publicar uma pesquisa. Repare que não estamos falando de um iniciante. Isso é a duração de um doutorado inteiro. Pra conseguir publicar um artigo!

Tenho incontáveis pesquisas que tentei publicar em conferências e revistas e recebi seguidas rejeições. Algumas eu segui tentando e melhorando mas não teve jeito. Em algum momento tive que aceitar a derrota e deixar de lado. Faz parte. Outras eu consegui pegar cada uma das rejeições e melhorar até ficarem num ponto irrefutável. Consegui tapar todos os buracos. Como diz já diz o título de um livro de Cal Newport, “So good they can’t ignore you”.

Desde o começo do meu doutorado, até o terceiro ano, sempre que apresentava algo em conferências eu levava uma ou outra invertida de algum pesquisador que estava assistindo minha apresentação. Ou recebia alguma pergunta que não sabia responder. No quarto e último ano, quando consegui consolidar bem a pesquisa depois de apanhar tanto, fui apresentar meus resultados pela última vez em uma conferência na Nova Zelândia. Vários dos maiores pesquisadores do mundo na minha área de pesquisa assistindo minha apresentação. Em seguida, uma sequência de perguntas desses super pesquisadores. Respondi uma a uma sem nem piscar. Já tinha apanhado tanto que quando eles começavam a pergunta eu já sabia onde ia chegar e já tinha a resposta na cabeça. No intervalo da sessão eis que um pesquisador daqueles de nível entidade, que o mundo todo lê os livros dele como referência, veio conversar comigo. Elogiou a apresentação e a pesquisa e propôs uma parceria. FUCK YEAH!

Posso afirmar sem sombra de dúvida que minha trajetória acadêmica me proporcionou muito mais fracassos do que minha carreira no mercado. Criar uma carapaça pra suportar isso foi algo que minha carreira no mercado não me preparou nem de perto. Essa experiência pode ser muito útil no mercado pra quem deseja tocar iniciativas mais fora das convencionais. No decorrer do texto vou elaborando algumas dessas possíveis iniciativas.

APRENDER A SEGUIR POR TRILHAS INCERTAS Essa é uma experiência que é fortemente relacionada às rejeições, mas acho que tem alguns aspectos sutis que valem ser explorados.

Atuar com desenvolvimento de software é algo muito imediatista. Você escreve um código, bota pra compilar e já sabe se tem algum erro. Desenvolve um sistema, bota pra rodar e já começam a aparecer os problemas quase que instantaneamente. O ciclo de maturação de quem trabalha com desenvolvimento de software, e do próprio software em si, é muito curto.

Poucas coisas na vida e na nossa carreira profissional tem essa característica.

Conseguir manter energia constante enquanto se trilha um caminho incerto é algo que exige um preparo e tanto. Principalmente quando se caminha no escuro por anos sem nenhum, ou poucos sinais, de que aquilo vai dar certo. Imagina só passar quatro anos, muitas vezes até mais que isso, trabalhando em algo sem saber se vai render alguma coisa. Sabendo inclusive que se não resultar em nada você “perdeu” esses anos. Isso é um doutorado!

Fonte desconhecida. Aí vai um breve relato desse tipo de situação…

Ingressei no meu doutorado com um tema pré-definido. Passei um ano e meio explorando esse tema sem muito sucesso. Perto do fim do segundo ano resolvi mudar totalmente de tema e joguei todas as fichas em uma nova direção. Passei uns três meses trabalhando de 10 a 12 horas por dia. De domingo à domingo, somente nisso. Depois de colher todos os resultados escrevi um artigo e submeti para um conferência internacional das mais relevantes na minha área de pesquisa.

Enquanto esperava o resultado decidi investigar algo que me veio à mente enquanto estava fazendo a pesquisa principal. Para mim uma contribuição pequena. Mas como estava à mão e tinha um prazo logo a frente de uma outra conferência, decidi investir um pouco de tempo nisso. Toquei essa pesquisa em menos de um mês e com bem menos intensidade. Eis que nesse meio tempo saiu o resultado do artigo principal que botei tanto esforço.

Rejeitado!

Peguei as revisões, juntei os cacos, fiz as melhorias e submeti os dois papers para essa outra conferência. O da minha pesquisa principal que tenha sido rejeitado, e esse outro “bestinha”. Alguns meses depois saiu resultado.

O paper principal foi rejeitado (pela segunda vez) e o secundário foi aceito, e muito bem aceito.

Fui apresentar ele na Espanha e recebi muitos retornos positivos. Muita gente interessada. Daí em diante segui em duas linhas paralelamente. Um era da pesquisa que eu julgava ser minha principal. Peguei as revisões e trabalhei em cima. E o outro caminho era o da pesquisa “bestinha”. Comecei a tocar pesquisas que eram desdobramento naturais dela.

Pra minha surpresa esse segundo caminho se provou muito mais frutífero, dia após dia.

Não que tenha sido um mar de rosas, porque pesquisa nunca é fácil. Mas nos próximos dois anos, até o final do meu doutorado, publiquei mais cinco artigos nessa linha. Todos em conferências e revistas internacionais de alto impacto na área. Fui apresentar um artigo na Irlanda; no ano seguinte dois artigos na Argentina e um no Canadá; e no último ano um artigo de revista e um que já mencionei antes, na Nova Zelândia.

Enquanto isso o meu artigo inicial da linha principal seguia sendo rejeitado, ano após ano, submissão após submissão.

Ao todo foram cinco rejeições, se não esqueci alguma delas. Durante três anos. Dá pra imaginar que em algum momento essa deixou de ser minha pesquisa principal. Enquanto isso, aquele outro caminho improvável que eu não pus muita fé se mostrou cada vez mais real. Daí tive que aceitar ele como minha pesquisa. ME RENDI À REALIDADE.

Dois anos depois de defender meu doutorado o tema ainda segue rendendo frutos. Várias colaborações com pesquisadores/instituições de mais de cinco nacionalidades. Mais artigos publicados. Alunos de mestrado e doutorado que agora eu oriento ainda seguem nessa linha. E no ano que escrevo este texto, 2020, fui convidado a escrever um capítulo de um livro junto com os maiores especialistas do mundo na área.

A história é longa, mas quero acreditar que mostra bem o ganho que se tem ao trilhar caminhos incertos. Aprender a insistir, desistir e eventualmente abraçar as oportunidades quando e como elas aparecem.

É uma experiência que é possível trazer para sua carreira no mercado pra te dar força pra tentar tocar iniciativas menos convencionais. Por exemplo, você que já é um desenvolvedor ou gerente bem estabelecido pode tentar fazer com que sua voz seja ouvida na sua comunidade.

Como virar um comunicador e referência dentro da sua comunidade?

Esse é um caminho mais incerto do que seguir a trilha de desenvolvedor tradicional. De empresa em empresa. Mas de repente pode te dar um retorno pessoal e profissional imenso. A experiência acadêmica, indiretamente, e de maneira pouco óbvia, poderia te ajudar a encarar iniciativas desse tipo. Mais incertas. E DAÍ VOCÊ TERIA MAIS UMA CESTA.

APRENDER A ESCREVER Esqueça esse negócio de fazer ciência. Pesquisar na academia é tudo sobre escrever.

Tirando o claro exagero (obviamente fazer ciência é sim o objetivo principal da pesquisa acadêmica), escrever é muito importante numa trajetória de pesquisa. O dia de a dia de quem pesquisa é ter ideias, colocar essas ideias à prova, analisar os resultados, e escrevê-los para divulgá-los. Escrever, escrever e escrever. Seguramente escrevi algo entre 20 e 30 artigos dentro do período de seis anos do meu mestrado e doutorado. Isso dá uma média de 3 a 5 artigos por ano. Como você já se sabe, nem todos foram publicados. Provavelmente a maior parte deles.

Fonte desconhecida. E qual a utilidade disso para a minha carreira no mercado?

Quando estamos no início da nossa carreira, tudo é novo e estamos sempre aprendendo algo. O mais importante é entender como as coisas funcionam e dominar os aspectos técnicos da nossa profissão. No caso de quem trabalha com desenvolvimento de software, é dominar linguagens de programação, frameworks, padrões de projeto, arquitetura, algoritmos, processos, etc.

Depois de alguns anos de experiência atingimos um platô. Não é fácil seguir crescendo verticalmente.

Pra seguir se desenvolvendo e colhendo melhores resultados a gente vê que o desafio maior é a comunicação. Saber se comunicar e se relacionar com nossos pares e nossa comunidade é o único caminho. Daí vem a importância da escrita.

Escrita, provavelmente, é a melhor forma de estruturar ideias. Você pode escrever textos para compartilhar com sua equipe; internamente para sua empresa; ou até mesmo publicamente para sua comunidade. Isso pode ajudar a alavancar sua carreia. De repente você vira referência na sua empresa e até na sua comunidade ao levar essa atividade a sério.

Escrita também pode ser suporte para outros tipos de comunicação.

Seja por voz (ex. podcasts), por vídeo (ex. youtube), ou ao vivo (ex. palestras). No HiDev Podcast tenho que estruturar um mínimo de roteiro escrito para que ele flua de maneira aceitável. Tenho também outro exemplo recente. Depois de terminar o doutorado fui convidado pela OAB (a Ordem dos Advogados do Brasil) para dar uma palestra no evento nacional de propriedade intelectual. Tinha que falar sobre tecnologias que poderiam mudar a prática jurídica. Pra fazer a palestra li bastante coisa sobre o tema e depois senti a necessidade de decantar o que aprendi escrevendo. Daí surgiu o texto: O futuro (e o presente) da prática jurídica em tempos de inteligência artificial. Que depois virou uma apresentação e que por fim virou uma palestra. Fiquei bem satisfeito com o retorno que recebi dos advogados que estavam no evento. Consegui me comunicar com outra comunidade!

Mesa composta por advogados da área de propriedade intelectual que atuam em Brasília, Curitiba, Rio de Janeiro e Recife… e um outsider. Encontre o outsider. Antes de fazer meu mestrado eu ficava impressionado como alguém poderia escrever cem ou duzentas páginas sobre algo. Depois que você passa pelo processo vê que é tudo muito natural. Hoje em dia escrever é uma atividade que incorporei de maneira intuitiva no meu processo criativo. Não tem como fugir.

Mas escrever todo mundo sabe. Escrever bem e de maneira sistemática, isso pouca gente domina.

A academia te força a ter esse tipo de experiência. Aqui eu escrevo de maneira mais livre. Mas com toda certeza minha prática exaustiva de escrita durante meu mestrado/doutorado foram fundamentais para destravar e ganhar fluência na escrita.

Você pode pensar que escrita científica é maçante e sem graça, e você tem uma certa razão.

Mas sem sombra de dúvida é um treino e tanto para você estruturar suas ideias. Além do mais, pra ser justo, tenho achado a escrita científica cada vez mais objetiva e sem firula. Ao menos na área de computação. Se você submete um artigo pra uma conferência ou revista científica de qualidade e começa com aquela retórica digna de gerador de lero-lero, é certeza que seu artigo será rejeitado. Mas claro, há certos aspectos das escrita científica que precisam permanecer para garantir o rigor do que se reporta. Afinal, cada tipo de escrita tem seu objetivo.

DESENVOLVER O PENSAMENTO CIENTÍFICO Quem trabalha com desenvolvimento de software tem um certo privilégio porque de algum modo teve que desenvolver o raciocínio algorítmico. Tem a possibilidade de usá-lo de maneira ampla na sua carreira/vida. Programar nos ensina como olhar para problemas grandes e complexos e quebrá-los em problemas menores e tratáveis. Desenvolvedores de software são exímios solucionadores de problemas. Um mestrado/doutorado coloca uma camada extra por cima dessa aptidão, permitindo um nível a mais de sofisticação do pensamento. O tal pensamento científico.

O raciocínio algorítmico se preocupa com o “COMO” e o científico com o PORQUÊ.

Pesquisar é aprender a fazer perguntas. É dar um passo pra trás nas nossas convicções e se perguntar… Mas porque isso ocorre? E se eu fizer de outro forma, o que mudaria?

Fonte desconhecida. Fazer as perguntas certas é muito mais importante do que simplesmente saber responder perguntas já feitas. Principalmente quando elas não são boas. O raciocínio algorítmico nos torna excelentes executores. Excelentes respondedores de perguntas. Já o pensamento científico nos leva a explorar o campo das perguntas. Aprender a fazer as perguntas certas. Que se respondidas nos levarão aos melhores resultados.

Por que eu deveria seguir o plano de carreira da minha empresa? E se trocando de emprego, com outra cultura, mais alinhada aos meus objetivos pessoais, eu conseguisse obter melhores resultados? Mas e se o problema for eu? Por que eu quebro a cara sempre em certas coisas? E se eu fizesse diferente aqui, ou acolá? As perguntas são eternas. Algumas boas, outras nem tanto. Umas serão respondidas, outras seguirão em aberto. Esperando que alguém as responda.

REDE DE PARCEIROS GLOBAL O meio de pesquisa é mais global e dinâmico que o do mercado. Isso tem um efeito colateral positivo, que é a criação de uma rede de parceiros mais ampla e diversa quando atuamos na academia.

Por mais que a gente mude de empresa e projeto, por mais que tenhamos trabalhado com colegas ou clientes estrangeiros, ainda assim tendemos a ter uma rede de contatos mais restritiva no mercado.

Por que isso?

Porque é muito comum, passarmos um ano, muitas vez mais que isso em um mesmo projeto de software. Convivendo com os mesmo colegas. Em contato com os mesmos clientes. As mesmas pessoas.

Quem atua como pesquisador, principalmente depois de terminar o doutorado, costuma tocar várias pesquisas simultaneamente. Cada uma dessas pesquisas envolve diversas pessoas do seu grupo de pesquisa, mas também pessoas de fora dele. Muitas delas inclusive são pesquisadores do exterior que investigam temas correlatos aos seus e acabam tornando-se seus colaboradores. Os contatos são mais pontuais e focados.

É assustador quando paro para pensar quantos pesquisadores já trabalhei direta ou indiretamente até hoje

De cabeça consigo enumerar facilmente pesquisadores de mais de 15 nacionalidades de várias instituições de pesquisa. E toda esse interação pode criar laços bem fortes. Principalmente quando você faz pesquisa e publica artigos em parceria com essas pessoas.

Tudo isso acaba te abrindo as portas para o mundo e te tornando um cidadão global de fato.

Fonte desconhecida. Antes de entrar no meio acadêmico só havia feito uma viagem para o exterior. Só conhecia um único país além do Brasil. Contando os carimbos e vistos no meu passaporte, vejo que já estive em 17 países em 5 continentes. Tudo devido às minhas pesquisas. Depois de passar por tantas imigrações, ter que resolver tantas questões de viagem, de visto, de acomodação, de aprender a me locomover nas várias cidades, interagir com as pessoas nas ruas, etc … Isso me tornou muito mais aberto a ver que o que fazemos no Brasil, quando bem feito, é de nível global e que não tem grandes dificuldades de ir trabalhar/morar fora. Se essa for sua vontade.

DOMÍNIO DO INGLÊS Um requisito básico para que a rede de parceiros de um pesquisador seja ampla e global é o domínio do inglês. Meu inglês enquanto só atuava no mercado era aquele feijão com arroz. Conseguia ler texto técnico com facilidade, escrever emails curtos e era bem limitado em conversação.

Já trabalhei em diversos projetos com clientes estrangeiros, mas nada durante a minha atuação no mercado fez meu inglês ter um upgrade tão grande quanto minha vivência acadêmica.

Estou longe de ter um inglês perfeito, mas atualmente sou bem destravado. Leio tudo em inglês sem nem pensar. De textos técnicos a livros de ficção e não-ficção bem longos (mais de 600 páginas) sem nenhuma relação com computação. Escrevo com facilidade. Foram mais de 30 artigos escritos. Consumo videos e filmes em inglês sem legenda sem perceber que estão em inglês. Converso com tranquilidade com pessoas e já cheguei a fazer apresentação em inglês para platéias com mais de 100 pesquisadores. Considerando que eram platéias naturalmente críticas, isso eleva ainda mais o nível de preparo para fazer essas apresentações. Não sei precisar ao certo como se deu toda essa evolução, mas quando olho para o antes e o depois, a diferença é gritante.

A necessidade foi ditando o meu desenvolvimento no inglês.

Quando trabalhamos no mercado de desenvolvimento de software no Brasil é possível evitar muitos contatos diretos com clientes estrangeiros e deixar que outras pessoas da nossa equipe resolvam isso. Na academia não tem como correr. A leitura e a escrita em inglês são diárias e não dá pra terceirizar. Ou vai ou racha. Isso sem falar das apresentações em conferências e conversas com pesquisadores que só entendem inglês e são a única saída para destravar algum aspeto da sua pesquisa.

STATUS Esse é sem dúvida o menos importante dos itens anteriores. É também um tópico delicado. O risco de escorregar e ser mal interpretado é grande. Mas tentar é preciso.

Ter um doutorado te dá um status na sociedade. Te torna uma referência, alguém que deve ser ouvido.

Fonte desconhecida. Os doutores deixaram de ser figuras tão raras com o aumento de pessoas seguindo a carreira acadêmica. Mas ainda assim o título tem um apelo que sem dúvida pode te abrir portas tanto no mercado como na interação com a sociedade de maneira geral.

O problema do status é você se perder nele.

O ideal é deixar que as pessoas reconheçam seu valor. Entregue resultado e deixe que o reconhecimento chegue. Não leve muito a sério essa coisa de título de mestrado/doutorado. O melhor doutor é aquele que você convive e não faz a menor ideia que ele é doutor. Procuro me cercar deles. Meu orientador (Sérgio Soares) e co-orientador (Gustavo Pinto) de doutorado são grandes exemplos disso. Se você conversa na rua nem imagina. Mas ambos tem feitos notáveis não só na academia como na sociedade de maneira geral. Em nível nacional e internacional.

Posso afirmar que meus alguns bons anos de experiência no mercado tornaram minha tragetória como pesquisador muito melhor e mais fácil. Então escrevi um outro texto pra responder a pergunta aí de baixo.

Como usar sua experiência no mercado a seu favor quando for fazer um mestrado/doutorado em computação?

No twitter (@brunocartaxo) estou sempre conversando e postando coisas relacionadas à vida de quem faz mestrado e doutorado, inclusive focando em pessoas que atuam no mercado.

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